O blogger de Felix Ramos

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Os grupos étnicos e as suas línguas


 

Os grupos étnicos e as suas línguas

 

As línguas originalmente faladas em Angola, como em qualquer país africano, são as dos povos africanos residentes na região. A implantação geográfica destes povos, hoje designados como etnias, no fim da era colonial depreende-se do mapa constante desta página; apesar das vicissitudes das décadas pós-coloniais, esta distribuição espacial continua no essencial inalterada. Convém reter que, em termos globais, a esmagadora maioria dos angolanos – perto de 90% – é de origem bantu.

O principal grupo étnico bantu é o dos Ovimbundu que se concentra no centro-sul do país, ou seja, no Planalto Central e algumas áreas adjacentes, especialmente na faixa litoral a Oeste do Planalto Central. Os Ovimbundu constituem hoje um pouco mais da terceira parte da população, e a sua língua, o umbundu, é por conseguinte a segunda língua mais falada em Angola (a seguir ao português) com quatro milhões ou mais de falantes[nota 3]. Por causa da Guerra Civil Angolana, muitos Ovimbundu fugiram das zonas rurais para as grandes cidades, não apenas para Benguela e Lobito, mas também para Luanda e até para cidades geograficamente periféricas como Lubango, transportando assim a sua língua para regiões onde esta antes não era falada.

Em termos de importância numérica, o segundo grupo são os Ambundu que representam cerca da quarta parte da população. A sua língua, o kimbundu, é falada por cerca de três milhões de falantes, maioritariamente na zona centro-norte, no eixo Luanda-Malanje e no Kwanza-Sul. O kimbundu é uma língua com grande relevância, por ser a língua tradicional da capital, hoje provavelmente com mais de 5 milhões de habitantes. O kimbundu legou muitas palavras à língua portuguesa e importou desta, também, muitos vocábulos.

No norte, nas províncias do (Uíge, do Zaire) e parte do Kwanza-Norte, concentra-se a maior parte dos Bakongo que representam hoje pouco mais de 10% da população. A sua língua kikongo (ou kikoongo) era a do antigo Reino do Kongo e tem diversos dialectos (tal como também as tem o umbundu e o kimbundu). Em consequência da guerra pela independência muitos Bakongo refugiaram-se na hoje República Democrática do Congo onde boa parte aprendeu também o francês e o lingala, língua de comunicação na parte ocidental daquele país. A maioria dos refugiados Bakongo, e/ou seus filhos e netos, regressou para Angola a seguir à independência, reinstalando-se em geral no seu habitat de origem, mas formando também núcleos populacionais importantes nas cidades situados fora desta área, principalmente em Luanda. Deste modo, também o kikongo, está hoje de algum modo presente em boa parte de Angola, com mais de um milhão de falantes.

Os Côkwe estão presentes numa boa parte do leste de Angola, desde a Lunda Norte ao Moxico e mesmo ao Bié. Enquanto mais a norte constituem, juntamente com os lunda, a população exclusiva, a sua presença mais a sul e cada vez mais dispersa e se mistura com a dos pequenos povos da região, habitualmente designados pelo termo Ganguela. A língua côkwe tem vindo a sobrepor ao lunda, mas aparentemente não às línguas de outros povos.

Os povos designados como Ganguela - Lwena, Luvale, Mbunda, Lwimbi etc. - não constituem uma etnia abrangente, e cada um fala a sua língua, embora estas sejam de certo modo aparentadas. A que frequentemente se designa como "língua nganguela" é na verdade apenas a de uma população residente a leste e sul de [[Menongue}}.

Um outro conjunto de povos é, desde os tempos coloniais, classificado como Nyaneka-Khumbi, mas tão pouco constituem uma etnia abrangente, nem pela sua identidade social, nem por uma língua comum.

Diferente é o caso dos Ovambo que são um grande grupo étnico existente principalmente na Namíbia, mas em parte significativa também na província do Cunene, no sul de Angola. A sua língua é o Oshivambo, a língua africana mais importante da Namíbia. Em Angola esta língua é geralmente falada na forma dos dialectos próprios dos diferentes subgrupos. O subgrupo de maior destaque é aqui o dos Kwanyama (também escrito "cuanhama"), mas há ainda os Kwamatu, os Kafima, os Evale e os Ndombondola.

No sudoeste de Angola existem pequenos povos aparentados aos Herero, principalmente os Vakuval ("Mucubais"), os Himba e os Dimba.

A situação étnica e linguística actual no extremo sudeste de Angola, na província do Cuando Cubango, é mal conhecida e constitui neste momento o objecto de um estudo em curso.

Finalmente existem no sul de Angola grupos residuais de khoisan, descendentes de povos não bantus que falam as suas línguas especificas.

Por último, cerca de 3% da população actual é caucasiana (maioritariamente de origem portuguesa) ou mestiça, população que se concentra primariamente nas cidades e tem o português por língua materna. De referir, ainda, a existência de um número considerável de falantes das línguas francesa e lingala, explicada pelas migrações relacionadas com o período da luta de libertação e pelas afinidades com as vizinhas República do Congo e República Democrática do Congo.

Promoção das línguas nacionais

Durante o período colonial, o uso das línguas indígenas estava praticamente circunscrito ao ensino do catolicismo. Contudo, a língua portuguesa não conseguiu fixar-se em todo o território devido à limitada utilização que as populações africanas dela faziam, principalmente nas zonas rurais, permanecendo as línguas indígenas, relativamente intactas.

Com a independência do país, algumas dessas línguas adquirem o estatuto de línguas nacionais, coexistindo com a língua portuguesa como veículos de comunicação e expressão, teoricamente em pé de igualdade.

Com vista à valorização, utilização e promoção das línguas locais, o Instituto de Línguas Nacionais de Angola fixou normas ortográficas dos idiomas côkwe, kikongo, kimbundu, nyemba (gangela), oshikwanyama e umbundo, estudando os aspectos fonéticos, fonológicos, morfossintácticos, lexicais e semânticos. Os resultados deste trabalho de investigação serviram de base à elaboração de material didáctico para a futura introdução destas línguas no ensino primário, em paralelo com o português.

Nos media as línguas africanas são também utilizadas, por exemplo, pela emissora de rádio Ngola Yetu (Nossa Angola, em kimbundu), que emite diariamente programas e notícias em sete idiomas.

Situação do português

A adopção da língua do antigo colonizador como língua oficial foi um processo comum à grande maioria dos países africanos. No entanto, em Angola deu-se o facto pouco comum de uma intensa disseminação do português entre a população angolana, a ponto de haver uma expressiva parcela da população que tem como sua única língua aquela herdada do colonizador.

São vários os motivos que explicam esse fenómeno. O principal foi a implantação, pelo regime colonial português, de uma política assimiladora que visava a adopção, pelos angolanos, de hábitos e valores portugueses, considerados "civilizados", entre os quais se encontrava o domínio da língua portuguesa. Por outro lado, há que ter em conta também a presença de um elevado número de colonos portugueses, espalhados por todo o território, bem como dos sucessivos contingentes militares portugueses que, durante o longo período da Guerra Colonial, se fixaram no interior do país.

Apesar de ser um processo impositivo, a adopção do português como língua de comunicação corrente em Angola propiciou também a veiculação de ideias de emancipação em certos sectores da sociedade angolana. Principalmente a partir de meados do século XX, a língua portuguesa facilitou a comunicação entre pessoas de diferentes origens étnicas. O período da guerra colonial foi o momento fundamental da expansão da consciência nacional angolana. De instrumento de dominação e clivagem entre colonizador e colonizado, o português adquiriu um carácter unificador entre os diferentes povos de Angola.

Com a independência em 1975, o alastramento da guerra civil, nas décadas subsequentes, teve também um efeito de expansão da língua portuguesa, nomeadamente pela fuga de populações rurais para as cidades—particularmente Luanda -- levando ao seu desenraizamento cultural e forçando a rápida adopção do português.

A própria implantação do novo Estado nacional reforçou a presença do português, usado no exército, no sistema administrativo, no sistema escolar, nos meios de comunicação, etc.

Embora, oficialmente, o governo angolano declarasse defender as línguas nacionais, na prática, tendeu sempre a valorizar exclusivamente aspectos que contribuíssem para a unificação do país—o português como a única língua unificadora—em detrimento de tudo o que pudesse contribuir para a diferenciação dos grupos e a tribalização — a miríade de línguas e dialectos regionais e étnicos.

Embora as línguas nacionais ainda sejam as línguas maternas da maioria da população, o português é já a primeira língua de 30% da população angolana—proporção que se apresenta muito superior na capital do país -- e 60% dos angolanos afirmam usa-la como primeira ou segunda língua[4][5].

Língua oficial e do ensino e um dos factores de unificação e integração social, o português encontra-se aqui em permanente transformação. As interferências linguísticas resultantes do seu contacto com as línguas nacionais, a criação de novas palavras e expressões forjadas pelo génio inventivo popular, bem como certos desvios à norma padrão de Portugal, imprimem-lhe uma nova força, vinculando-a e adaptando-a cada vez mais à realidade angolana. Alguns dos muitos exemplos são as palavras: "kamba", "kota", "caçula" ou "bazar", que provêm de vocábulos kimbundu, di-kamba (amigo), dikota (mais velho), kasule (o filho mais novo) e kubaza (fugir), respectivamente. Para além dos já plenamente dicionarizados na língua portuguesa, batuque, bobó, bunda, bumbar, bué, cambolar, capanga, catinga, curinga, dendê, gingar, ginguba, jimbolo, jingo, machimbombo, maxim, minhoca, missanga, mocambo, mocotó, moleque, munda, mupanda, mutula, muzungo, pupu, quibuca, quilombo, quitanda, samba, sibongo, tacula, tamargueira, tanga, tarrafe, tesse, ulojanja, umbala, xingar e muitos outros.

A língua literária em Angola distinguiu-se sempre pela presença das línguas locais, expressamente em diálogos ou interferindo fortemente nas estruturas do português. Embora quase exclusivamente em língua portuguesa, a literatura angolana conta também com algumas obras em kimbundu e umbundo.

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